Governo garante que sistema de mobilidade vai avançar, só não se sabe por que “caminho”. Mas certa é a mudança da solução tecnológica, que pode não passar pela ferrovia. Autarcas mostram “preocupação”
Pouco ou nada de concreto saiu ontem da reunião entre os presidentes das câmaras de Coimbra, Miranda e Lousã com o ministro das Obras Públicas, António Mendonça, e o secretário de Estado dos Transportes, Correia da Fonseca. Respostas da tutela são particularmente vagas, o que deixou alguma «preocupação aos autarcas».
De acordo com João Paulo Barbosa de Melo, há «factores positivos e negativos» e o mais importante será o de que «não está em causa o Sistema de Mobilidade do Mondego». Todavia, não se sabe em que moldes, o que «para nós é preocupante». Isto porque, e «contrariamente às minhas expectativas e dos outros autarcas, estão ainda a ser estudadas soluções para garantir essa mobilidade». E o presidente da Câmara de Coimbra não deixa de lembrar que «há tempo para tudo, para estudar e planear, mas isso foi feito há mais de 15 anos e foi tomada a decisão de avançar com este projecto, com determinadas condicionantes, nomeadamente ser baseado na ferrovia».
E é esta base ferroviária, ou seja, a solução eléctrico rápido que, à partida, parece não estar a ser bem vista pelo Governo, que equaciona, explicou o presidente da Câmara de Coimbra, «mudar a solução tecnológica». «Não tenho nenhum tabu relativamente à ferrovia», diz, com algum humor Barbosa de Melo, sublinhando que a «preocupação», sua e dos restantes presidentes de câmara se prende com os “timings”. Isto porque «o senhor ministro e senhor secretário de Estado dizem que os estudos não estão feitos», e inclusive, adianta, «não há qualquer certeza» que as soluções alternativas «possam funcionar».
“Nadamos a planear
há 15 anos”
«Devíamos estar no tempo de fazer e não de planear, porque andamos a planear há 15 anos», acrescenta o autarca de Coimbra. Este é «um cenário fora do tempo», remata.
Todavia, os autarcas mostraram-se disponíveis e abertos «para reduzis os custos, onde for possível», tendo em conta a «situação difícil que o país atravessa». É também possível, refere Barbosa de Melo, «aumentar a comparticipação comunitária», que actualmente é de cerca de 12/13 por cento. «Há muitas coisas que é possível fazer», garante, apontando para o facto de o Metro do Porto ter, neste momento, comboios excedentários, «que podem ser emprestados se a nossa linha for feita», o que «iria permitir reduzir drasticamente o impacto financeiro nestes próximos dois/três anos». «E há mais situações que é possível ajustar», de forma a reduzir os investimentos, diz ainda Barbosa de Melo, alertando para o investimento já realizado e para o facto de ser possível, também, equacionar uma recalendarização do projecto.
Mas os autarcas, apesar de preocupados com a falta de soluções e a perspectiva de mais estudos, ainda não perderam a esperança que, «depois desta reunião, o Governo pondere o que nos propõe e conclua que este projecto, equacionado há quase 20 anos faz todo sentido que avance».
Positiva, foi, no entender de Barbosa de Melo, a disponibilidade «demonstrada pelo ministro, para dar sinais concretos de que o projecto é para continuar». E, nos próximos dias ou semanas os autarcas de Coimbra, Miranda e Lousã acreditam que «irá haver novos desenvolvimentos». Positivo foi também, sublinha, o facto de se ter assistido ao «retomar do diálogo» com o Governo que, nos últimos tempos tem andado “azedo”.
Opinião partilhada pela presidente da Câmara de Miranda que, apesar de também elogiar a abertura ao diálogo por parte do Governo, teme as consequências de uma nova fase de estudos, sem qualquer calendarização. «Não é agora que se vai estudar novos sistemas, depois de já terem arrancado a linha», afirmou Fátima Ramos, considerando que a alternativa avançada, do sistema metro-bus, «se fosse boa já no-la tinham apresentado».
“Retrocesso”
A autarca receia que, caso o processo se venha a arrastar, se deite dinheiro fora. «É um contrasenso, todo o investimento que já está feito seria perdido», alertou, recordando que já foram investidos cerca de 100 milhões de euros na linha e que «a Baixa de Coimbra está esventrada».
Face à falta de resultados concretos na reunião com a tutela, Fátima Ramos avançou fazer questão de estar hoje na manifestação em Lisboa para «dizer no gabinete do senhor primeiro-
-ministro que não é altura para fazer estudos».
Já para o presidente da Câmara da Lousã o resultado da reunião com a tutela «é um retrocesso em relação ao processo», precisamente pela retomada dos estudos. «Vamos mais uma vez sacrificar as populações com a manutenção dos serviços alternativos de transportes», considerou Fernando Carvalho, apontando os utentes que não beneficiam de transporte directo.
O autarca considera, portanto, que tal resolução «é prejudicial para as populações e ainda mais prejudicial porque não conseguimos ter os “timings” para apresentar os estudos». «Esse é efectivamente o grande obstáculo», desabafou, garantindo estar ao lado das populações nas manifestações de protesto pelo ramal, atendendo à falta de resoluções no processo.
Governo não pode “dar o dito por não dito”
Movimento Cívico reúne hoje com gabinete de Sócrates
Jaime Ramos, responsável do Movimento Cívico de Lousã e Miranda, que tem assumido a força da contestação ao processo do metro nos últimos dias, mostra-se incrédulo com os resultados, ou melhor, “não resultados”, da reunião de ontem em Lisboa. O médico e presidente do conselho de administração da Fundação ADFP não esteve presente, mas os “dados” chegaram-lhe rapidamente e acendem a sua veia mais crítica. «Estes dois membros do Governo, o senhor ministro e o senhor secretário de Estado, não percebem nada do assunto e não têm nível para estar no Governo», disse, ontem ao Diário de Coimbra.
Esclarecendo, Jaime Ramos adianta que «se há dois ou três dias criaram boas expectativas nas populações», referindo-se aos resultados de uma reunião entre o presidente da Federação Distrital de Coimbra do PS, Mário Ruivo, e o secretário de Estados dos Transportes, «não podem dias depois virar o bico ao prego e dar o dito por não dito, a não ser que o dr. Mário Ruivo nos tenha enganado, o que não acredito», rematou.
Desencantado com a reunião de ontem, Jaime Ramos está particularmente empenhado no encontro que hoje irá ter com o gabinete de José Sócrates. Isto porque o porta-voz do movimento que pugna pela reposição da ligação ferroviária entre Coimbra e Serpins, foi ontem contactado pelo gabinete do primeiro-ministro, no sentido de participar numa reunião, a realizar hoje, entre as 12h00 e as 13h00. Jaime Ramos desconhece quem serão os interlocutores deste encontro, que se realiza no âmbito do “Cantar as Janeiras”, que Coimbra, Miranda e Lousã vão realizar hoje em Lisboa.
“Ramal dos simples”
Na comitiva que vai hoje à capital dar os presentes dos “reis” a José Sócrates, encontra-se também o grupo Cantar Arte-Via, da Lousã, que vai dar uma nova vida à famosa música “O Natal dos simples”, de Zeca Afonso. Especialmente adaptada para as “janeiras” de hoje, a música chega a Sócrates com o nome “O Ramal dos simples”, da autoria de Augusto Simões.
Com partida de Coimbra por volta das 8h30, os manifestantes vão concentrar-se em frente à Assembleia da República às 11h45. Dali partem para a rua da Imprensa à Estrela, onde está sedeado o gabinete do primeiro-ministro, regressando a Coimbra às 15h00.
Afirma secretário de Estado
Estudos comparativos apresentados a 30 de Janeiro
«Não vamos parar nada para estudar. Continuaremos ao ritmo das possibilidades», disse o secretário de Estado, Correia da Fonseca, ontem no final da reunião, apontando o final do mês, dia 30 de Janeiro como uma data provável para voltar a reunir com os autarcas e analisar as alternativas técnicas em perspectiva. O governante admitiu, de resto, que nesta data conta ter em seu poder uma análise comparativa dos vários sistemas, entre os quais o metrobus é uma das possibilidades. Se concluir que existe um sistema mais adequado para a plataforma, acrescentou, «dever-
-se-á avançar com ele».
Ontem de manhã, o governante admitiu, em declarações à Lusa, que o Governo «não tem hipótese, neste momento, de investir os 455 milhões de euros previstos para o Metro do Mondego», garantindo, todavia, um bom «sistema de mobilidade alternativo». E destacou a necessidade de encontrar uma forma de assegurar essa mobilidade, através do metro, o que implicará «um grande tempo de construção», ou de outro processo, mais rápido , que os municípios escolham.
Correia da Fonseca reconheceu, em declarações à Lusa, que foram feitas obras da plataforma e disse esperar «continuar as obras», «não podemos é garantir que vamos já assentar carris, pôr catenárias e preparar tudo para termos o metro dentro de pouco tempo».
Para o governante, a obra do metro não pode ser definida como prioritária, mas será possível «dilatar no tempo» a sua concretização. Nesse sentido, disse ainda estarem a ser estudadas alternativas possíveis e que a curto prazo será tomada uma decisão conjunta, envolvendo os municípios.
MÁRIO RUIVO INDIGNADO
“Alguém anda a brincar com Coimbra”
Mário Ruivo, que esta semana trouxera, de uma reunião com o secretário de Estado dos Transportes das Obras Públicas, a certeza de que o projecto de Mobilidade do Mondego iria ter continuidade na sua essência, reagiu ontem de forma contundente ao suposto recuo dos governantes: «antes de chegar à política formei-me como cidadão e só sei estar na política com seriedade e honestidade».
Sem referir o nome de Correia da Fonseca, o líder distrital do PS foi igualmente incisivo ao observar que quem não tem estes valores tem de abandonar a política, rejeitando em absoluto fazer «o papel de palhaço». «Nem comigo, nem com o PS, nem como Coimbra», insistiu, ao recordar que a Federação Distrital do Partido Socialista emitiu um comunicado em que reclama duas coisas: «a concretização do compromisso do Estado com os cidadãos e que seja através de um projecto de mobilidade eléctrica», como estava delineado.
Se assim não for, «alguém anda a brincar com Coimbra», concluiu, dando a entender que irá ter outras reuniões com responsáveis políticos sobre este assunto.
Da reunião com Correia da Fonseca resultara a certeza para Mário Ruivo de que a execução da obra não estava em causa, estando o Governo para apresentar uma solução que tornasse o projecto rentável, nomeadamente com a inclusão de uma ou duas estações no circuito urbano do metro.
«A solução a apresentar aos presidentes de câmara não põe em causa a execução, vai criar condições para que se possa pôr o metro a funcionar (…) e dissipar as dúvidas que as populações têm», antecipara Ruivo, certo de que a reunião de ontem com os autarcas não seria para Correia da Fonseca dizer que se estão a fazer estudos comparativos de vários sistemas e que o metrobus é uma das possibilidades.
Fonte: Diário de Coimbra
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